Deu-se no cabaré das Malvinas. Reunidos aleatoriamente os seguintes elementos: Mozart, Penca Preta, Zenito, Sander Lee, Joacir e mais uma meia dúzia de mulheres folgadas. Estamos bebendo cachaça Pitu com caldo de feijão verde frio porque o gás acabou e a dona do bordel não tem um bojão de reserva. Mais de meia noite, o assunto virou pra organização da classe trabalhadora. O seleto grupo fazia parte da comissão de greve do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, sendo que nenhum deles jamais pegou em uma enxada pra capinar. Éramos puros e idealistas, e ainda mais bêbados, a bronca contra o sistema chegava ao limite do ridículo.
Chegou Beto Palhano com sua bolsa a tiracolo e um retrato do Che Guevara na camisa encardida, bicado e entrando na discussão já radicalizando:
--- Por que não apoiar a classe das trabalhadoras do sexo? Essas meninas são as mulheres mais exploradas do sistema capitalista.
No que recebeu apoios de todos, menos das meninas propriamente ditas, porque essas já estavam mais pra lá do que pra cá, sendo que a melhorzinha em condições etílicas era a jovem Bezinha, levando-se em consideração que Julieta, a dona da pensão, ficou na condição de patroa e, portanto, opressora da classe raparigal. Mesmo assim foi aprovada a ideia de fundação do sindicato das raparigas e afins, sendo que esse “afins” foi representado na ocasião pelo baitola Nega Tonha, garçom e alcoviteiro daquele singelo cabaré.
Bezinha rejeitou a proposta de ser aclamada presidente da agremiação sindical das putas, mesmo porque era analfabeta de pai, mãe e parteira. Com a mania de querer organizar tudo, chegou o trotskista Idalmo, juntando-se ao grupo histórico e redigindo o manifesto de fundação do sindicato das rameiras “como instrumento de mobilização e de luta, que buscará construir na diversidade a unidade dos setores combativos, lutando por melhores condições de trabalho, fim do xexo e regularização da atividade de cafetinagem, entre outras bandeiras”. Sujeito solene e carismático, radical nas posturas éticas, tanto que é o único que não comeu Bezinha.
Pelo critério de quem estava menos bêbada, foi eleita a menina Iracema como presidente do sindicato, sob protestos de Biu Penca Preta porque sua esposa usava aquele belo nome indígena e “era uma senhora de bem”. Como presidente de honra foi escolhida a nega Buliu, emérita representante das mulheres de Lesbos. Diante dos pedidos para dar uma palavrinha, Buliu manda todo mundo à merda e vai para a cozinha com Nega Tonha ver se encontra alguma coisa nas panelas.
Professor Idalmo, então, declara fundada a organização, conclamando as meninas a lutar por benefícios da previdência e cachês dignos. Joacir emendou que deveriam também pedir dedução no imposto de renda para compra de material de trabalho, incluindo roupa, camisinhas, objetos eróticos e produtos de beleza. “Já imaginou a força de vocês, fazendo uma greve de sexo?”, lembrou Sander Lee.
Acabado o estoque de cachaça, deu um desânimo geral em todo mundo. Na mesa, restaram Bezinha e mais uma quenga velha por nome Furico de Porco. A esta altura, os meninos de pileque também já dormiam na mesa quando Furico teve uma bela ideia, que essa mulher tinha a cara de idiota, mas era “tampa de furico” na prática. Uma rifa para ajudar na organização do novo sindicato. Quem for sorteado poderá satisfazer sua fantasia sexual financiada pelo Sindicato, que pagaria o quarto da pensão de Julieta e a parceira do ganhador, com direito a uma meiota de cana e dois cajus. Se o distinto sorteado gostar de queimar rosca, pode ter uma noite inesquecível com a travesti Nega Tonha.
No dia seguinte, de ressaca, ninguém lembrou do sindicato, mas Julieta não esqueceu da conta do que se comeu e bebeu. Incluindo o xibiu de Bezinha.
Naquela tarde de cinzas
ResponderExcluirGuiado pela chama do desejo
Estive onde se compra o pecado
Mas se mendiga um frio beijo.
Na falta de um beijo
Tomava uma gelada Coca-cola
Quando me fitando percebi
Ao lado de uma vitrola
Belos olhos com tanto mistério
Aquilo me enfeitiçou sem demora.
Entreguei-me a um baile de fantasias
Onde me aqueci no fogo da Colombina
Uma mulher que escondia suas malícias
Em singelas curvas de menina.
Eu era o ingênuo Pierrô
Num gélido viver
Buscando o amor
Todavia sentimento tão divinal
Inexistia num universo
De orgias, pecado e eterno Carnaval.
Acompanhando uma grande erupção:
Deleite, delícia, sublime prazer carnal
Então, nossos corpos separaram-se
Era assim o começo do final.
Passeava em minha mente
Versos do “ramalhista cantor”
Numa de suas canções
De melancolia, desilusão e dor:
‘NOSSA RELAÇÃO ACABASSE ASSIM
COMO UM CARAMELO QUE CHEGASSE AO FIM”.
JAIRO LIMA
(Poeta e ativista cultural ararunense)
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